“O Futuro da Universidade” em debate pela Plataforma Cidades: as Expectativas, a Realidade e os Desafios pelo Prof. Luís Oliveira e Silva
Escrito por AVfm em 20/09/2022
No próximo sábado, dia 24, a Plataforma Cidades promove o primeiro encontro “Quo Vadis Universidade” do ciclo de debates de “O Futuro da Universidade”. O evento terá lugar na Casa de São Sebastião, no nº. 42 da rua de Aveiro com o mesmo nome, entre as 10h00 e as 17h00.
A parte da manhã é reservada aos membros da Plataforma Cidade e a sessão da tarde, das 14h30 às 17h00, será aberta ao público, após inscrição para o email plataformacidades.op@gmail.com. O encontro será centrado nas intervenções e reflexões de António M. Feijó, Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) e de Paulo J. Ferreira, Reitor da Universidade de Aveiro (UA).
Para promover um encontro e debate ativo e consciente, a Plataforma Cidades está a disponibilizar artigos de opinião sobre a temática.
O segundo artigo “Expectativa dos novos Estudantes; A Universidade que vão Encontrar; E os Desafios desta e de todos nós”, de Luís Oliveira e Silva, Professor Catedrático do Departamento de Física, Instituto Superior Técnico & Academia das Ciências de Lisboa, foi publicado no passado dia 30 de agosto, no Jornal I, tendo sido reeditado com a devida autorização do autor.
1.
Terminou recentemente a candidatura à primeira fase do acesso ao ensino superior. Os candidatos já nasceram no séc. XXI e os seus pais e mães, quando/se frequentaram o ensino superior, fizeram-no nos anos 90 do séc. XX. No início de cada ano, as expectativas das novas alunas e alunos são elevadas.
Que diferenças fundamentais, relativamente à geração anterior, encontrarão quando iniciarem as aulas em setembro? E que devemos ambicionar para as universidades e para o ensino superior daqui a 30 anos?
As diferenças e os progressos são impressionantes, mas os desafios para a próxima geração são ainda maiores.
O número de estudantes universitários quase duplicou, de cerca de 120 mil em 1993 para 208 mil em 2021, representando uma importante democratização do acesso a estudos superiores; a expansão no subsistema politécnico foi ainda mais forte, com mais de 411 mil alunos em 2021 no ensino superior (contra 246 mil alunos em 1993) [1].
Os novos estudantes encontrarão um conjunto de docentes qualitativamente diferente. O número de docentes acompanhou o aumento do número de alunos – as universidades, em 1993, contavam com 11 mil docentes enquanto em 2020 eram cerca de 22 mil. No entanto, a fração destes docentes que é doutorada aumentou consideravelmente; o número de docentes doutorados quase quintuplicou, de cerca 3 mil docentes doutorados (cerca de 27%) para mais 15 mil docentes doutorados em 2020 (quase 70%).
A expectativa dos novos estudantes é encontrarem um ensino que toca as fronteiras do conhecimento e cada vez mais integrado com a investigação científica, que lhes permita crescer, e vir a ter carreiras profissionais enriquecedoras. Aqui o salto é também significativo – para além do corpo docente com uma percentagem muito elevada de doutorados, a dotação pública para a investigação científica aumentou (valores a preços constantes de 2016), de 614 M euros em 1993 para 1458 M euros em 2021 (quase um fator 2,4).
As universidades, como instituições, também se modernizaram apreciavelmente, como fruto de várias reformas – nas carreiras, na regulação, na organização interna e na qualidade da gestão, na relação com as instituições científicas e na sua avaliação – hoje são instituições muito mais modernas, resilientes, internacionalizadas e abertas à sociedade do que em 1993.
A sua evolução é exemplar (principalmente para o resto da administração pública) e proporcionam um ambiente muito mais diverso e inspirador aos seus alunos em 2021 do que a quem as frequentou nos anos 90 do séc. XX.
Estes avanços têm sido conseguidos sem um incremento apreciável no financiamento público. A despesa pública no ensino superior em 2019 foi de 2033 M euros, enquanto em 1999 foi de 2058 M euros (a preços de 2021), correspondendo a um financiamento público por aluno de cerca de 5300 euros por ano em 2019; em 1999 o financiamento público foi 5800 euros por ano e por aluno.
Este cenário demonstra o salto que o ensino superior conseguiu dar no espaço de uma geração, contribuindo para formar uma população mais alargada, aumentando a qualidade do seu corpo docente e da ciência que fazem, sem um aumento apreciável do investimento público.
Os novos estudantes encontrarão instituições consideravelmente melhores do que as que os seus pais e das suas mães.
O país e as universidades claramente ultrapassaram o desafio da democratização da formação universitária.
Do ponto de vista internacional, as nossas universidades ocupam posições honrosas nos diferentes rankings, considerando a dimensão do país, da população estudantil e da despesa pública no ensino superior. Por exemplo, no ranking da Times Higher Education, 3 universidades estão colocadas no top 1000; no ranking de Shangai 6 universidades estão colocadas também no top 1000, sendo notável que em algumas áreas (Engenharia Naval e Oceânica, Ciências e Tecnologias Alimentares, Oceanografia e Engenharia Civil) existam instituições no top 75 do Mundo.
Mas será que este caminho é suficiente para o que ambicionamos conseguir nos próximos 30 anos?
2.
Existem dois desafios importantes.
> O primeiro desafio é já evidente: a competição pelo talento é global e a circulação dos alunos universitários potenciada pelo programa Erasmus está já endogeneizada em toda a Europa e em Portugal, alargando-se até aos alunos que transitam do ensino secundário para o ensino superior.
Com cada vez mais frequência, os melhores estudantes exploram oportunidades fora do país e as melhores instituições do mundo oferecem condições financeiras que, em alguns casos, suplantam a vantagem de “estudar em casa”.
Ter instituições capazes de reter alguns dos melhores alunos (através de programas de ensino inovadores, forte ligação à ciência e à sociedade e apoios sociais) e, simultaneamente, atrair também os melhores alunos de outros locais do mundo é fundamental na competição pelo talento e para o desenvolvimento económico baseado no conhecimento.
Por outro lado, a evolução demográfica portuguesa implica que o número de potenciais estudantes universitários será necessariamente mais baixo durante a próxima geração (mantendo-se as atuais taxas de fertilidade e taxas de aprovação no ensino secundário).
> Aqui é fundamental continuar a aumentar o número de alunos que transitam para o ensino superior e, simultaneamente, atrair alunos estrangeiros numa escala significativamente mais ambiciosa – aumentar a reputação global e a visibilidade internacional das universidades é, de novo, o ponto central para responder a este desafio.
As escolhas a fazer para responder a estes desafios são complexas (aumento apreciável do financiamento público? forte diferenciação institucional?), principalmente num contexto de recursos escassos.
Em muitos países na Europa esta transformação já foi concretizada e em cada país reconhecemos algumas universidades claramente globais.
3.
Também estas escolhas serão inevitáveis em Portugal se pretendermos que o ensino superior continue a ser um dos motores para a transformação e desenvolvimento do país como observámos nos últimos 30 anos.
Posteriormente pode partilhar a sua reflexão e opinião, sobre o que defende ou lhe pareça oportuno, com a Plataforma Cidades, através do email plataformacidades.op@gmail.com.
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