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Às Três foi de vez: Tiago Bettencourt subiu ao palco com bandas filarmónicas de Ovar

Escrito por em 20/06/2024

São nove e meia da noite. Esperamos impacientemente pelo aguardado concerto de Tiago Bettencourt, já adiado em duas ocasiões anteriores.

O que nos trará o artista português, na celebração dos seus vinte anos de carreira? Podemos apenas esperar por um serão de orgulho, ao ver as bandas da nossa cidade partilhar o palco com um artista de renome no panorama nacional.

E é precisamente por aí que começamos – entram apenas as bandas em palco, imediatamente trazendo consigo o seu inconfundível tom majestoso e heroico. Ouvimos música enérgica, fresca e cativante, e confirmamos de imediato o veemente poderio da banda, que vamos ver alicerçar o intérprete de maneira genuinamente notável durante todo o concerto.

Particularmente na primeira peça, o que se denota de interessante é como o habitual tom cinemático é alvo de fusão com uma percussão muito mais pop-rock, o que lhe dá um toque carismático e inebriante.

A segunda peça tornou-se particularmente relevante pela sua linguagem harmónica, inovadora de maneira impressionantemente dramática, sem perder o caráter quase cibergalático da obra – sem dúvida o principal a destacar de uma peça deveras programática e vívida.

E então sim, entra Tiago Bettencourt em palco – e para a minha sorte, começa logo com a minha preferida do seu repertório: “Canção de Engate”.

É difícil pôr em palavras o quão perfeitamente magnífica esta música é. A voz melíflua e gaiata de Bettencourt, o ambiente feérico, o acompanhamento da banda magnificamente envolvente, e uma vivacidade e pura felicidade de encher o coração bem até ao topo, instantaneamente – uma canção que vive no meu coração, sempre.

Na verdade, outro aspeto digno de destaque foi a guitarra, que denota inspiração no pop-rock e não simplesmente num estilo mais de balada, ainda que seja incrivelmente expressiva – tal como a ouvimos em “Maria”, canção extremamente pungente, como a voz do cantor a torna, e onde as bandas trazem sonoridades louvavelmente interessantes a todo o quadro, novamente engrandecendo uma música já de si vivaz e contagiante, e por vezes tornando-a ligeiramente jazzística quando coadunada com a percussão.

“Se me deixasses ser” é contada quase como um sussurro, um sussurro intimista e sonhador de um amor devoto, desejoso de futuro. Este é um bom exemplo do caráter musical de Tiago Bettencourt, cuja música é sempre de uma alegria contagiante e sedutora de qualquer ouvinte – mas o que ainda me agradou mais do que a jovialidade das suas canções foi o sabor a esperança que era patente em toda a sua obra, um travo indescritível e tocante a esperança, doce, fresca e pura.

Em “Trégua”, exploramos um novo ambiente, com um ritmo que se destaca por ser novo e mais enérgico, mesmo aquele criado pelos instrumentos da banda e riff da guitarra. E vejamos se não é o meu instrumento predileto que entra em seguida?

Tiago Bettencourt senta-se ao piano e ouvimos “Fúria e Paz”, seguida de “O Jogo”, um tema indubitavelmente sonhador e contemplativo, e tanto o piano como a voz maravilhosamente doces e comoventes permeiam a música que ouvimos, que nos toca com tão carinhosa pulcra.

De seguida, uma das habituais secções gaiatas e grandiosas características do artista, acompanhadas na perfeição pela banda, sumptuosa e imponente, que cria uma sonoridade envolvente sem igual.

Em “Morena”, para além do piano aconchegante e meigo, é realçada outra das minhas características preferidas na música de Tiago Bettencourt – o intimismo e a pura afeição, um amor tão claramente querido e comovente, e sempre o desejo por um amor verdadeiro, quente, um amor que é abrigo eterno e de confiança.

Segue-se uma das canções, na minha opinião, mais tocantes, por ser adoravelmente melancólica – em “O Jardim”, o cariz de ternura a que já vimos a ser habituados só adensa o desgosto de um amor que podia ser tão belo não ser correspondido (o que talvez seja bastante relacionável).

Em seguida, “Caminho de Voltar” traz-nos um sentido de cumplicidade, e que é tornado pela banda nalgo muito enérgico e relevante. É, precisamente, em canções como esta que se nota a maneira fantástica como a guitarra do cantautor se combina perfeitamente com a sonoridade da banda, criando um timbre com tanto de singular como de sublime. E bem sei que estamos aqui pela música, mas a poesia, outra das minha paixões, foi sem dúvida algo que fez as minhas delícias neste concerto.

Em “Carta”, uma das, senão a mais sobejamente conhecida das canções de Tiago Bettencourt, não consegui deixar de me comover com os tocantes versos que acompanhavam tão gaiata música, com frases tão lindas como “saudade é o ar que vou sugando e aceitando como fruto de Verão nos jardins do teu beijo”, ou “desculpa se te usei como refúgio dos meus sentidos, pedaço de silêncios perdidos que voltei a encontrar em ti”. Simplesmente fabulosa, e qual a nossa sorte em poder assistir a uma performance ao vivo de uma canção tão bela.

“Viagem” foi, sem dúvida, uma das mais comoventes – e a barra já estava bem lá em cima! Se as anteriores eram sobre amor terno e afetuoso, esta era sobre amor por um ente querido, talvez mais jovem do que o sujeito lírico. Era um tema talvez reminiscente do famoso provérbio inglês, “se amas algo, deixa-o partir”.

E quão belo o suave aconchego com que se incita a prosseguir sonhos, e quão potente o entrar da banda que torna esta afeição tão emocionante, acompanhada por uma obediente saudade de alguém que ainda não partiu, e quão nobremente retratado o agridoce de amar alguém o suficiente para o deixar ganhar asas e partir para novos horizontes, horizontes tão brilhantes que só poderiam ser sonhados.

Por último (e para animar a malta), ouvimos “Dança”, um tema vivo e dinâmico, memória valiosa de um concerto soberbo.

Em suma, um concerto de emoções à flor da pele, lindíssimas, de um ambiente magnífico e canções encantadoras. Não poderia recomendar mais deixarem-se permear por música tão enternecedora, porque depois deste concerto não tenho a menor dúvida em considerar este artista merecedor de reconhecimento pelo panorama musical português, pois possui um legado musical de valor cultural incalculável.

Mais uma vez, não poderia deixar de referir o quão incrivelmente orgulhosa fiquei de ver as nossas bandas tocarem ao lado de um célebre artista português, e numa oportunidade tão bem-aproveitada para criar um momento tão belo, e a recordar para sempre.

E que sorte que foi presenciar um momento como este – atrevo-me a dizer que este serão não podia ter sido muito melhor empregue.

Deixo a entrevista conjunta realizada aos maestros Tiago Correia e Bruno Pereira, da Banda Filarmónica Ovarense e da Sociedade Musical Boa União, respetivamente:

Confira alguns momentos do concerto, pela lente de António Dias:

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Fotos: António Dias
Texto: Mariana Rosas

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