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Mi-Fá-Dó-Sol | 20 Jun 2024

Carlos Reis e Dino Marques 20/06/2024

 

 

Emissão: 20 de Junho 2024

Descrição: Programa inteiramente dedicado ao Fado. Realizado por intérpretes do género musical, Mi-Fá-Dó-Sol foca-se na divulgação de artistas e eventos, sem deixar de lado a história e as curiosidades de tão importante património português!

 

 

Destaque: Fado, música do mundo

Cada livro a sua história e as múltiplas maneiras de ser lido. E quando os anos apagaram das memórias um autor que não passou aos compêndios e os factos que refere parecem ter-se tornado demasiado longínquos e anódinos, chamar a atenção para um livro seu e justificar a sua importância é também sugerir algumas das maneiras de o reler. É o que fazemos hoje com a História do Fado de Pinto de Carvalho (Tinop), cuja apresentação nos merece duas observações prévias.
Por um lado, esta não deverá ser tão longa que espartilhe ou condicione a leitura de um texto que se oferece veloz e divertido e que permanentemente surpreende pelo inesperado desenlace de um acontecimento circunstancial, pelo pormenor extremo que parece aproximar-nos dos hábitos de um qualquer personagem obscuro, pela anedota temperada de adjetivos sonoros e cortantes de que apenas se adivinha o significado. Neste sentido, trata-se de um livro que transmite ao leitor o profundo prazer do autor ao escrevê-lo e se lê de um fôlego como livro de aventuras que também é. Qualquer introdução (e também esta) irá, assim, perturbar o encanto da sua descoberta. Por outro lado, porém, o muito que se tem escrito sobre o fado e a ambiguidade dos discursos que o envolvem obrigam-nos a esboçar uma breve síntese dos tipos de texto que constam da sua bibliografia para melhor situar entre eles a História que vamos ler.
O discurso ideológico é a tónica dominante de grande parte da extensa bibliografia (algumas dezenas de títulos) que se ocupa do fado. Os juízos de valor sobre ele emitidos ajudam a obscurecer um objeto já de si mal definido. De um lado, uma quantidade de pequenos textos, de escasso interesse, normalmente aparecidos na imprensa periódica; paralelamente, alguns outros que mais solidamente refletem as preocupações de autores de finais de século que pensaram a decadência (Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Fialho de Almeida) e de outros que no limiar e durante o Estado Novo falavam de ressurgimento.
Importa aqui destacar O Fado, Canção de Vencidos de Luís Moita, livro dedicado à Mocidade Portuguesa, onde se reúnem as palestras feitas pelo autor em 1936, na Emissora Nacional e em que se combate acerbamente aquela forma de expressão, mas onde simultaneamente se referencia o maior conjunto de documentação sobre o tema à época existente. É de referir que um dos mais recentes textos publicados, A Mitologia Fadista de António Osório (1974), não escapa à projeção ideológica do autor, inserida agora num outro contexto: a crítica de valores veiculados por um regime veladamente contestado e que o fado claramente espelhava. Em todos estes textos, uma conclusão radical: o fado não é a canção nacional.
Muitas das críticas ao fado provocaram igualmente respostas, também elas empolgadas pelo discurso ideológico dos autores, sendo particularmente de referir O Fado e os seus Censores (1912), obra do tipógrafo anarquista Avelino de Sousa, que via nessa canção o veículo natural e privilegiado da luta social das classes oprimidas. Em sentido oposto, o filósofo Álvaro Ribeiro viu nele a cristalização da essência de uma alma nacional e chegou a estabelecer as bases de uma «doutrina fadista» que o pudesse preservar das corrupções. Para todas as defesas mais ou menos apaixonadas, a insistência na expressão há muito divulgada: o fado, a canção nacional.
Para além desta caracterização, forçosamente genérica, de uma componente constante da maioria dos escritos sobre o fado e que se traduz em tomadas de posição contra (a maioria) ou a favor, alguns aspetos relativos a ele são recorrentemente tratados na literatura. Assim, um conjunto de textos aborda a questão das suas origens. Os primeiros aparecem no final do século XIX e continuam até à década de 30, momento a partir do qual apenas se retomam hipóteses já formuladas anteriormente. Variando na solidez da sua argumentação, conseguem por vezes estabelecer articulações com o passado imediatamente anterior ao da sua implantação como forma musical autónoma. De qualquer modo, da perspetiva sócio antropológica em que nos colocamos, julgamos esta uma falsa questão.
Saber se essa origem é árabe, africana, brasileira, provençal, popular, ou se reside no balanço cadenciado e murmurante do mar ou ainda numa qualquer especificidade da alma nacional, é de importância menor em relação àquilo que nos parece ser uma questão de fundo: a sua emergência em certos bairros da capital no segundo quartel do século XIX, o quadro histórico e condições sociais da sua reprodução/ transformação.
Podemos incluir num segundo grupo as abordagens propriamente musicais (Lambertini, Ernesto Vieira, Gallop, Frederico de Freitas) que frequentemente fazem contrastar o fado com a música tradicional portuguesa ouvida nos ambientes rurais das distintas províncias, ressaltando desse confronto o valor menor ou mesmo o carácter espúrio do primeiro, algumas vezes sujeito a apreciações extramusicais baseadas na negatividade dos valores que parece trazer associados – são disto exemplo as páginas que Armando Leça e Fernando Lopes Graça lhe dedicaram. E devem ainda incluir-se neste grupo os textos que mais especificamente se referem aos instrumentos ligados ao fado.


Playlist:
Carlos Macedo – Esquina de rua
Amália Rodrigues – Fado Final
Tristão Da Silva – Cara Bonita
Maria Da Fé – Pode Ser Mentira
Linda Leonardo – Lisboa sei-te de cor
Manuel De Almeida – Fado menor
Tony de Matos – Recusa
Zé António – Não venhas tarde
Marlene Alves – Asas
José Fernandes – Setembro
Manuel Delindro – Rosa gelada
Dina Tereza – Novo Fado da Severa
Cidália Moreira – Fado Freira
Fernando Maurício – O Leilão

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Publicação: Irina Silva
Foto(s): Direitos reservados

Mi-Fá-Dó-Sol

Vibram as cordas... Bem Vindos ao Fado!

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