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Gestão Florestal do Perímetro das Dunas de Ovar: o Plano da discórdia defendido pela CMO e pelo ICNF

Escrito por em 10/02/2022

A Câmara Municipal de Ovar (CMO) promoveu, ao início da tarde de ontem, uma Conferência de Imprensa com a intenção de detalhar e esclarecer a comunidade acerca do Plano de Gestão Florestal (PFG) do Perímetro Florestal das Dunas de Ovar, validando a opção pelos procedimentos que se estão a concretizar no terreno.

O momento contou com intervenções de Salvador Malheiro, presidente da autarquia, e de Nuno Sequeira, vogal do Conselho de Administração do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Face à polémica que o avanço do abate de árvores tem vindo a gerar, foram muitos os Órgãos de Comunicação Social presentes, havendo no final oportunidade para um longo período de esclarecimento de questões.
Os oradores foram ladeados pelos presidentes das Juntas de Freguesia de Esmoriz, Cortegaça, Maceda e União das Freguesias de Ovar, ao longo das quais se estende o território em causa.

O Perímetro Florestal das Dunas de Ovar é uma área submetida ao Regime Florestal Parcial desde 1920, estando sob a gestão do ICNF, diretamente sob a tutela do Departamento da Conservação da Natureza e das Florestas do Centro.

O plano que tem gerado a discórdia (disponível aqui), vigente até 2026, foi apresentando em 2016, tendo então recebido pareceres favoráveis à sua aplicação. O mesmo esteve aberto a consulta pública, entre 1 de agosto e 12 de setembro desse ano, não tendo sido apresentada qualquer proposta de alteração.

Salvador Malheiro – presidente da CMO

Salvador Malheiro abriu a sessão, assumindo a intenção de esclarecer o descontentamento de cidadãos, forças políticas e outras entidades que, no seu entender, ou possuem pouco conhecimento técnico-científico sobre os procedimentos e acreditam genuinamente que algo de errado está a acontecer no município ou então recorrem à polémica num estratagema mal-intencionado para denegrir o trabalho da autarquia e do ICNF.

O edil esclareceu desde logo que o previsto não é um abate massivo e pediu que se terminem com as insinuações sobre possíveis especulações imobiliárias, garantindo:

na atual zona de floresta vai continuar a existir no futuro, apenas e só, floresta

Caraterizando o Perímetro Florestal das Dunas de Ovar como a primeira faixa florestal consolidada e bem gerida na zona litoral a sul do Porto, ocupando 17% do território do concelho com os seus 2584 hectares, mostrou-se convicto de que a gestão, levada a cabo pelo ICNF está bem entregue. Reconhecendo que o Instituto é a entidade com mais competência e recursos em Portugal, garantiu que a autarquia e as freguesias irão continuar a exigir, junto da entidade gestora, o cumprimento do plano definido.

Quantificou que a área onde estão previstos abates até 2026 totaliza 247 hectares, representando uma área equivalente a menos de 1% de todo o Perímetro Florestal das Dunas de Ovar.

Defendeu que o plano agora questionado é muito mais que o abate de árvores, englobando o controlo das espécies invasoras, a gestão de combustíveis orgânicos, a preservação da biodiversidade, o enquadramento paisagístico, a manutenção da rede viária, a ordenação de acessibilidades e atividades de lazer e recreio e a plantação de pinheiros mansos e sobreiros.

Quanto ao abate de exemplares adultos, o edil explicou que os lotes intervencionados eram compostos, na sua grande maioria, por pinheiros bravos já resinados, em período fim de vida, decrépitos e incapazes de realizar a principal função de sequestrar dióxido de carbono.

Nuno Sequeira – vogal do ICNF

Numa intervenção de teor mais técnico, Nuno Sequeira fundamentou os procedimentos que estão a ser efetuados, assegurando não estar a ser cometido nenhum crime ambiental. O engenheiro do ICNF garantiu mesmo que “não fazer nada é o pior remédio”.

Explicando que cada talhão ocupa uma área de 28 hectares, Nuno Sequeira garantiu que os abates acontecerão em pequenas áreas, que não ultrapassarão os 5 hectares por talhão.

Referiu que a zona florestal de Ovar é caracterizada por árvores com idades muito idênticas, a completar agora 70 a 80 anos, o que justifica a sua substituição.

Tratando-se de seres vivos, o técnico explicou que as árvores, após uma certa idade, ficam à mercê de pragas e doenças, perdendo resistência, o que aumenta o perigo de quebras e de acidentes. Além disso, deixam de realizar a sua função mecânica de purificar o ar, não filtrando o dióxido de carbono.

Alertando que as árvores não duram para sempre, relevou a importância de manter a floresta jovem, com árvores de diferentes idades. Para tal, disse ser inevitável promover cortes, retirando as árvores que já não estão no seu período de vigor, dando oportunidade a novos exemplares.

Foi então tempo para os jornalistas colocarem questões, que foram sendo respondidas pelos presentes na mesa e no Salão Nobre, onde decorreu a Conferência de Imprensa. Fazemos o resumo dos temas principais em seguida:

Atrasos na execução do plano?

Relativamente ao calendário de execução dos abates e a um suposto atraso, Nuno Sequeira explicou que a gestão é adaptativa, havendo liberdade para ir percebendo quais as zonas e os momentos em que as intervenções devem acontecer. Assumindo períodos em que não se deve interferir na natureza, exemplificou com os incêndios de 2017, tempestades e outros acontecimentos, que levaram a repensar o ritmo do abate de árvores.

Adiantou que ao longo deste ano haverá mais parcelas de floresta a intervencionar, prevendo o abate de 20 hectares até dezembro de 2022.

Afastou a ideia de que haverá uma pressão na floresta para o cumprimento do plano até ao final de 2026, acelerando-se os abates para a sua efetivação dentro do tempo previsto. Referindo-se novamente à gestão adaptativa, garantiu que poderão mesmo surgir novos adiamentos, desde que benéficos para a floresta.

Foto do PCP de Ovar de parcela intervencionada

Regeneração Natural: e as espécies invasoras?

A floresta de Ovar encerra um forte banco de sementes de alta qualidade, localizado no próprio solo. Nuno Sequeira confidenciou mesmo que algumas sementes são recolhidas e usadas como referência, no que toca ao estudo das espécies arbóreas.

Nesse seguimento, explicou não haver necessidade de investir na replantação das zonas onde foram abatidas árvores, adquirindo espécies certificadas quando, no solo da própria floresta já existe um “património de sementes” que seria um erro e um desperdício ignorar.

Sérgio Vicente, presidente da Junta de Freguesia de Cortegaça, testemunhou, recordando que em 2012 foram abatidos cerca de 5 hectares de árvores adultas no seu território, onde hoje, sem a interferência humana, se encontram pinheiros com 2,5 a 3 metros de altura. Registou mesmo ser necessária uma redução da densidade, para que cada árvore se consiga desenvolver em pleno, evitando que o crescimento de alguns exemplares atrapalhem o desenvolvimento de outros.

Quanto às espécies invasoras, como as acácias e as austrálias, Nuno Sequeira salientou que essa monitorização é constante, não só em zonas recentemente limpas como nos restantes talhões onde não aconteceram abates. Tranquilizou quanto aos meios necessários para tal, referindo que o ICNF abriu já um concurso público que prevê a limpeza de 1.100 hectares, num investimento próximo de 1 Milhão de €uros, que deverá avançar no terreno ainda este ano.

E outras espécies?

Sendo predominante, o pinheiro bravo é uma espécie muito resistente às condições agrestes da zona litoral norte, caracterizada por um solo pobre (areia), ventos fortes, e alta salinidade proveniente da proximidade do mar.

A plantação de árvores autóctones terá de ser realizada em pequenas zonas, estrategicamente definidas, que proporcionem condições ao desenvolvimento de árvores folhosas, como o sobreiro. Tal tipo de árvores tem menor resistência, necessita de solos melhor preparados e abastimento de água constante.

E a proteção contra a erosão costeira?

Relativamente à questão levantada sobre a erosão costeira, sendo a floresta uma ferramenta fundamental na ajuda ao seu combate, foi assegurado que numa faixa de 500 metros, paralela à linha do mar, não haverá lugar ao abate de espécimes adultos em sequência. Tratando-se de uma zona mais sensível, o plano prevê uma “intervenção cirúrgica”, eliminando apenas algumas árvores identificadas.

Para além do registo áudio das intervenções iniciais de Salvador Malheiro e de Nuno Sequeira, que pode ouvir clicando nos player’s respetivos, deixamos-lhe alguns registos fotográficos, captados pela lente de Paulo Homem de Melo:

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Reveja a Conferência de Imprensa, na íntegra, disponível na página do Facebook da Câmara Municipal de Ovar:

Apesar de se ter sentido sempre presente, durante toda a conferência de imprensa não houve nenhuma referência ao Movimento 2030, ao seu líder Henrique Araújo ou aos seus representantes eleitos para a Assembleia Municipal. De fora ficaram também referências à Petição Pública “Salvem o Perímetro Florestal das Dunas de Ovar!“, iniciativa por eles promovida e principal veículo de contestação popular, que acabou por levar à necessidade da declaração conjunta da CMO e do ICNF.

Poucas horas depois, o Movimento 2030 emitiu um comunicado, onde lamenta a atitude do executivo municipal e anuncia que irá solicitar uma audiência ao Ministro do Ambiente, para alertar o que entende por abate massivo e desastre ecológico que está a decorrer em Ovar.

No momento em que publicamos este artigo, a referida Petição Pública mantinha 17.504 assinaturas.

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Fotos: Paulo Homem de Melo
Áudios: Jaime Valente
Texto: Irina Silva

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